Um Conto de
Natal
O frio
apertava naquela longa noite, as ruas estavam desertas, as luzes de várias
cores pareciam tristes na sua solidão, a azáfama das últimas compras já
acabara. Algures ouviam-se sons celestiais que provinham dos lares,
alegadamente, felizes. Vagueando estava, quem nada tinha. Os cafés estavam
fechados. Sentindo-se sozinho ansiava por encontrar alguém com quem conversar.
Do bolso retirou uma antiga fotografia da família, ainda, feliz. Rapidamente
brotaram-lhes lágrimas dos olhos. De repente guardou a foto que só lhe trazia
sofrimento e saudade. Voltou à sua lenta caminhada nocturna, ao longe avistou
uma luz que o impeliu a segui-la, nem queria acreditar ainda estava um café
aberto. Aproximou-se, o estabelecimento estava vazio, só avistou um senhor,
aparentemente de meia-idade, que
arrumava as mesas.
- Boa noite.
Posso entrar?
- Entre, mas
por pouco tempo, vou fechar. Respondeu o senhor que supostamente seria o dono
do estabelecimento.
- Está um
frio terrível!
- Quer beber
alguma coisa? Hoje ofereço um cafezinho.
- Sendo
assim aceito! Bem preciso.
- Homem…que
faz na rua em plena noite de Natal? Não tem família?
- A minha
família não quer saber de mim. Respondeu com amargura.
- Porquê?
- Porque
tratei-a muito mal…
Perante
estas palavras o homem ficou muito pensativo e algo emocionado.
- Disse algo
de mal?
-Não, só me
fez lembrar o meu caso.
- Também não
tem família?
- Que acha
que faço aqui esta noite? Já todos estão em casa com as suas famílias no
aconchego dos seus lares. Estou por aqui porque ninguém me espera. Ir para casa
faz-me sofrer!
- Porquê? –
Interrogou.
- A minha
mulher e os meus filhos perderam a vida num acidente!
- Meu Deus!
Lamento.
- Para
piorar tudo eu, nesse fatídico dia, tinha tido uma grande discussão com a minha
mulher pois cheguei a casa embriagado. Ofendi e maltratei quem tanto amava…
Perante
pesada consciência, as lágrimas já lhe rolavam no rosto. Continuou:
- …Ela,
desesperada com a repetida cena, saiu com as crianças e o destino encarregou-se
do resto.
Perante estas palavras, o cliente, comovido,
levantou-se dizendo;
- Jesus,
Maria e José! Tenho mesmo que ir!
- Então
homem? Não bebe o café?
- Não
consigo, tenho que recuperar o meu Natal enquanto é tempo. Obrigado senhor!
Obrigado! Desejo que seja feliz pois fez-me ver hoje o quanto tenho sido
egoísta e mau.
E dizendo
isto correu em direcção à saída, tendo tempo para uma breve paragem junto à
porta. Voltou-se para o interior e indagou…
- Homem…
venha comigo! Hoje Cristo cruzou-se no meu caminho, vamos passar juntos, a
noite de Natal!
- Obrigado,
quem sabe talvez para o ano. Boa sorte e Feliz Natal.
- Feliz
Natal!
Apressadamente
o homem avançou para a rua e ainda olhou para trás. Abismado, já não avistou
luz alguma. A porta estava fechada e nem sequer havia sinal de um café por ali,
só o frio e a escuridão reinavam…
Tomou o seu
rumo seguindo agora a sua luz interior, aquela que flamejava na sua alma agora
esperançosa e inundada de valores outrora adormecidos.
Paulo
Gonçalves