Construir um castelo todo feito de ar era o que sentia
Tiago, aquele pescador de olhos tristes e que a vida tanto maltratara. Naquele
dia sabia que tudo se poderia perder. O que restava também não era grande
coisa. Depois de ter perdido os pais e ganho a incompreensão de sua mulher, já
nada importava.
O vento, teimosamente soprava, e nem a ténue esperança de
uma recusa de aventura o consolavam. De facto a ordem de ir para a faina do mar
mantinha-se inalterada.
Ao chegar ao cais ainda parafraseou para Joaquim, seu
mestre;
- O mar não está de feição!
- Quero lá saber! Temos que nos aventurar! Quem não arrisca
não petisca! – Respondeu Joaquim.
As gaivotas esvoaçavam aquele cinzento céu, numa lamúria
flamejante, quando o barco já rasgava as águas do mar, aquele barco que lhe
devolvera a esperança de vida. O coração palpitava de ansiedade e nervosismo. O
medo tomara conta do seu ser.
Em alto mar, chuva e vento turvavam-lhe os olhos e a alma. A
instabilidade do que o rodeava comparava-se à sua própria instabilidade.
Por fim os gritos vitoriosos de Joaquim fizeram com que
acordasse para o que estava a acontecer…
- Força! Força! O peixe é nosso!
De uma só vez, a oval de rede descarregou uma quantidade
enorme de peixe.
- Vamos voltar. Temos venda! – Exclamou Joaquim para a sua “companha”
que vibrava de alegria.
De volta a terra o vendaval teimou na sua revolta e o mar
respondeu.
Uma enorme vaga avançou em direcção à embarcação que quase
tombou. A chegada à barra tudo se tornou mais complicado.
- Tenham calma! Vistam os coletes! - Ordenou Joaquim.
Imediatamente se dirigiu para o rádio em busca de ajuda.
Tiago estava em pânico, a sua vida poderia acabar naquele
momento.
Nova, e maior vaga, se aproximava. O desespero apoderou-se
de si e em altos brados dirigiu o seu olhar aos céus.
- Meu Deus, mais nada me resta! Nunca acreditei em ti! Neste
momento dirijo-me àquele em que nunca acreditei. Tem piedade de mim, da minha
mulher e do meu filho. Só tu me podes salvar! Ajuda-me!
De imediato a embarcação se inclinou perante a força da vaga
e encarreirou ganhando velocidade para a entrada do porto. Jamais poderia
acreditar que estava fora de perigo. Sentiu que Jesus o ouvira naquela hora de
aflição. A emoção aflui-lhe aos olhos.
A chegada ao cais fora inesquecível, avistara ao longe a sua
mulher, aflita, com o seu filho ao colo.
- Maria, eu não te largo mais. Tu e o meu filho são as minhas
maiores riquezas. Hoje descobri um novo e grande amigo.
- Quem?
- Aquele que me salvou a vida no mar e em terra, chama-se
Jesus.
Os olhos de Maria ficaram mar pelo verdadeiro milagre de
amor ocorrido na vida do seu marido.
Quantos de nós ainda somos como São Tomé e mesmo com tantos
milagres na nossa vida ainda necessitamos de visão porque o que o nosso coração
alcança não consegue sentir Deus.
Paulo Gonçalves